A solidão é definida como uma percepção cognitiva de que os relacionamentos sociais existentes na vida de alguém são insuficientes ou inadequados, gerando uma reação afetiva de tristeza e vazio. Isso significa que uma pessoa vivencia a solidão apresentando sentimentos exclusivamente negativos por não haver pessoas por perto ou se, mesmo na presença delas, não se sentir emocionalmente conectada a ninguém.1
Dessa forma, a solidão consiste em um sentimento angustiante e desagradável, que acompanha a percepção de que as necessidades sociais não são atendidas pela quantidade ou qualidade dos relacionamentos existentes.2
As pesquisas concluíram que ao longo da vida a solidão foi maior no final da adolescência, diminuindo gradualmente em adultos de meia idade, e posteriormente aumentando durante a idade adulta tardia. Indivíduos solteiros indicaram sentir-se mais solitários do que indivíduos casados. A importância do gênero em experimentar solidão é contestada. De maneira geral, autores descobriram que o nível médio de solidão não diferiu entre homens e mulheres.3
O isolamento social é definido como um estado objetivo de ter contato social mínimo com outros indivíduos, enquanto a solidão reflete um estado subjetivo de falta de afeto desejado e proximidade de uma pessoa significativa ou íntima, ou seja, solidão emocional, ou de amigos próximos e familiares, solidão relacional. Além disso, embora por vezes considerada sinônimo de morar sozinho, solidão e morar sozinho estão relacionados, mas não são categorias sobrepostas. De maneira ilustrativa, pesquisas com idosos demonstram que morar sozinho não é necessariamente indicativo de solidão, muitos deles relatando encontros sociais frequentes e envolvimento social ativo em organizações comunitárias.4
O estigma social é uma forma pela qual os membros dominantes da sociedade aplicam as suas normas, garantindo que as pessoas as cumpram, ou, caso contrário, sejam excluídos ou marginalizados. Dessa forma, o estigma associado à solidão corresponde a uma constelação de crenças que depreciam e desvalorizam aqueles que se sentem solitários, de modo a encorajá-los a ter padrões apropriados de conexão social e a cumpri-los.5
A solidão é uma experiência comum à espécie humana. Alguns estudos internacionais indicam que 80% das pessoas abaixo de 18 anos e 40% das acima de 65 anos relatam sentir solidão pelo menos algumas vezes por semana. Um estudo sobre a prevalência da solidão entre idosos em 12 países diferentes mostrou variação na prevalência da solidão entre 25% na Dinamarca a 60% na Grécia. Além disso, estudos sobre a população norte-americana mostram que entre 15% e 30% das pessoas acima de 65 anos sentem-se cronicamente solitárias.1
A prevalência da solidão varia amplamente entre os idosos, sendo de 9% no Reino Unido e 60,2% em Taiwan. Essa variabilidade pode ser explicada por fatores como diferenças interindividuais, ferramentas ou métodos de pesquisa usados, ou diferenças em origens culturais e sociais.6
Observa-se que muitos idosos lidam adequadamente com o processo de envelhecimento e até fazem da terceira idade o melhor período de suas vidas: saem para dançar, viajam e realizam atividades físicas e em grupos, não oferecendo oportunidade à solidão. Todavia, boa parte dos idosos não consegue superar determinadas circunstâncias devido às mudanças do próprio corpo e de sentimentos de inutilidade, seguindo para o isolamento de seu ciclo social. Envelhecer ocasiona diversas transformações biopsicossociais na vida do indivíduo e de seus familiares, com ganhos e perdas em seus direitos. Consequentemente, diversos prejuízos físicos, psíquicos e sociais podem contribuir para o surgimento do sentimento de solidão.7
Um autor comenta a existência da concepção de estar sozinho e ser sozinho durante o processo de envelhecimento. “Estar só” refere-se a um momento de solidão, que não é vivenciado com tanta frequência. Já o “ser só” remete a um indivíduo que vivencia a solidão de forma constante. Um momento de solidão pode representar uma alternativa para o encontro de novas pessoas, do surgimento de novos relacionamentos. Já outros indivíduos preferem permanecer neste momento de solidão, já que o surgimento de novas relações pode resultar, futuramente, em uma possível separação, com adicionais períodos de solidão.7
Queixas frequentes de solidão em idosos estão associadas a eventos normativos de transição ao longo da vida, tais como a saída dos filhos de casa, viuvez e aposentadoria. A solidão em idosos pode estar ainda relacionada a um déficit no suporte social, à perda de autonomia e deterioração da saúde e consequente diminuição do bem-estar.8
Em um estudo brasileiro conduzido na cidade mineira de Uberaba foram avaliados 156 idosos com idades entre 60 e 88 anos, sendo 83,3% do sexo feminino e 16,7% do sexo masculino. Um total de 10,9% apresentou solidão moderada a grave. Foram encontradas relações significativas entre solidão e os demais construtos: quanto maior o nível de solidão, mais sintomas de depressão, pior a autoavaliação em saúde e menor a prática de atividades prazerosas e bem-estar.8
Considerando os possíveis fatores de proteção para solidão em idosos, a promoção de contatos sociais na terceira idade por meio de grupos de convivência pode proporcionar bem-estar subjetivo e ajudar a amenizar esse sentimento negativo. Portanto, contextos na qual idosos têm oportunidades de estabelecer relações interpessoais significativas e praticar atividades prazerosas parecem oferecer benefícios à saúde mental, podendo resultar em menores níveis de solidão.8
A solidão é um fator de risco para a depressão, ideação e comportamento suicida, bem como para uma variedade de outros resultados psicológicos e fisiológicos negativos, déficits cognitivos e declínio cognitivo acelerado. Trata-se de uma condição psicológica debilitante, caracterizada por um profundo sentimento de isolamento social, vazio e ameaça pessoal.2
Com a solidão, há alterações fisiológicas, como aumento da resposta do cortisol ao despertar, fenômeno observado normalmente durante à noite, e expressão gênica pró-inflamatória. Além disso, a solidão está associada à depressão, baixa satisfação com a vida e baixa resiliência – particularmente em homens. Por isso foi considerada uma grande fonte de estresse psicológico, especialmente quando combinado com depressão. A relação entre solidão e sintomas depressivos é recíproca, enfatizando que ambos os construtos estão intimamente relacionados, mas distintos. A solidão também agrava a morbidade e a mortalidade de doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e outras enfermidades crônicas. Também tem sido relacionada ao declínio cognitivo e à doença de Alzheimer no envelhecimento. Em uma meta-análise recente, a falta de integração social funcional e estrutural previu uma elevação de 50% na mortalidade, comparável aos fatores de risco tradicionais. Em revisão atual resultado do acompanhamento de 35.925 participantes, encontrou-se um aumento de 29% para a incidência de doença coronariana, e 32% para acidente vascular cerebral em pessoas com relações sociais precárias. No Estudo Longitudinal Inglês do Envelhecimento (ELSA), descobriu-se que a solidão foi associada à inatividade física, tabagismo e múltiplos comportamentos de risco à saúde. Em reconhecido estudo, os autores descobriram que a solidão estava significativa e positivamente associada às consultas médicas entre pessoas com 60 anos de idade ou mais. São discutidos três caminhos principais pelos quais a solidão afeta a saúde:3
A compreensão mais profunda dos mecanismos neurobiológicos subjacentes à solidão é necessária para identificar potenciais alvos de intervenção. A síntese dos resultados publicados demonstra uma estrutura encefálica anormal, com relação ao volume da substância cinzenta ou integridade da substância branca e/ou atividade no córtex pré-frontal, especialmente medial e dorsolateral, ínsula em região particularmente anterior, corpo amigdaloide, hipocampo e córtex temporal superior posterior. Os achados relacionados ao corpo estriado ventral e ao cerebelo foram mistos. Estudos de ressonância magnética funcional relataram links entre a solidão e a ativação diferencial de redes de atenção e redes visuais. A solidão foi também relacionada a marcadores biológicos associados à doença de Alzheimer, como a carga de amiloide e de proteína tau. Embora tenham limitações, esta revisão sugere relação de solidão com estrutura e função alteradas em regiões e redes cerebrais específicas. Encontrou-se uma sobreposição notável de regiões envolvidas com a solidão e a compaixão, dois traços de personalidade que estão inversamente correlacionados em estudos prévios.9
A solidão é um sentimento penoso e angustiante, que conduz a um mal-estar em que o indivíduo se sente só, ainda que rodeado de pessoas, por pensar que lhe falta suporte, sobretudo de natureza afetiva.10
Os pesquisadores que desenvolvem esse campo nascente estão aprendendo muito sobre as potencialidades da solitude. No entanto, há carência de uma definição comum, ou um conjunto de definições.11
Solitude é uma parte comum e consequente da vida diária. Recentemente, tem surgido cada vez mais estudos explorando o tema sob aspectos sociais, psicológicos, relativos ao desenvolvimento e à personalidade.11
A solitude é um estado em que a relação dominante é com o próprio indivíduo. Caso não estejam fisicamente sozinhas, as pessoas em solitude permanecem mentalmente distanciadas e afastadas ativamente de interações mediadas por tecnologia. A solitude absoluta envolve a separação física e o foco interno, sendo melhor definida através de uma classificação que reconhece a separação física e o foco interno como características suficientes e independentes.11
Pesquisadores distinguiram a solidão da experiência de se estar sozinho ou solitude. A última reflete um estado de isolamento social que envolve um distanciamento voluntário da própria rede social, enquanto a solidão é involuntária e está mais intimamente associada a déficits na qualidade percebida das próprias interações sociais.4
Alguns autores fazem a distinção entre uma solitude “privada”, quando o indivíduo se encontra fisicamente afastado de outros, e uma solitude “pública”, na qual há pessoas presentes, porém elas não interagem ativamente. Argumenta-se que ainda não sabemos se a presença de mais pessoas influencia o pensamento e comportamento dos indivíduos enquanto estão em solitude, ou a extensão em que esse estado é qualitativamente diferente da solitude privada. A importância desta distinção reside numa série de fatores, incluindo se a solitude é melhor compreendida como um estado físico onde o isolamento físico é essencial. Nesse sentido, somente a solitude privada representaria a verdadeira solitude, ou essa percepção é de fato um estado psicológico focado no interior que pode existir na ocorrência do isolamento físico ou na presença de outras pessoas desde que não estejam se relacionando.12